Junho alvorece com alegria e esperança no sertão

          “Ô coisa boa”! Junho chegou! Nesses dois últimos dias apreendi, definitivamente, que aqui em Ipupiara; padre, médico, prefeito e antropólogo, não tem hora de trabalho, podem exercer seu ofício em   qualquer hora do dia, a qualquer momento. Afirmo isso pelo que tenho visto até agora. Hoje, primeiro dia do mês mais “arretado” do Brasil, foi momento de acordar cedo, antes das 5:00h já era momento de estar de pé. Cerca de vinte pessoas, mais os tocadores faziam a alvorada junina, foguetes anunciam estridentemente: “Estamos em Junho!” Que mês maravilhoso, estava ansioso por sua chegada! Durante todo tempo que estou aqui no sertão, tenho vivido com extrema expectativa a chegada desse mês. Ipupiara definitivamente já vive o São João, os reisados, reuniões são constantes, nos bastidores a festa já está acontecendo, antes mesmo de sua efervescência coletiva. Nem a seca está sendo capaz de apagar o fervor desse povo e a animação de todos. 

           A chuva ainda teima em se esconder, ela apareceu de maneira muito tímida por aqui, mas os sertanejos, mesmo que desacreditados pelas previsões do tempo, não perdem a esperança. Ah! A esperança tem sido outra agora, que chegue logo o São João, não só pelo seu lado festivo, religioso, por isso também, mas, sobretudo, por ser mais um momento de rever amigos, parentes, recordar lembranças, viver tradições! 

        Estudar festa, como já alerta diversos antropólogos, está longe de só curti-la, a tarefa é sem dúvida difícil e requer responsabilidade. As festas populares são momentos para poder apreender parte das comunidades que as organizam, seu modo de vida e de seus habitantes. Que vivamos as festas, que vivamos com intensidade o mês de junho e que, os santos juninos abençoem o povo do nordeste e do nosso querido sertão!

A seca "tá" castigando...

      Depois de quase dois meses sem escrever, já estava quase a desistir de voltar aqui. Nesses dias que passaram muitas coisas aconteceram. Estamos passando por um período muito difícil aqui, a seca está castigando cada vez mais nosso povo. A cada conversa é unanime que esta tem sido a pior seca dos últimos 40 anos, pior que essa houve uma na década de 1970. A diferença, segundo muitos, dessa época para aquela são os programas assistenciais do governo federal e número crescente de pessoas idosas com o beneficio da aposentadoria. Além disso, é grande o números de cisternas nas propriedades rurais de Ipupiara.

          

       São em momentos como esses que é possível dar o devido valor a água. Eu que venho do sul do Brasil, região abundante de água e chuva, jamais pude entender realmente o valor primordial da água. É claro que em nossos discursos estamos estafados de reconhecer que a água é fonte de vida, mas nossa vida não tem sido devidamente colocada a disposição para cuidar de tal bem. Foi aqui nesse pedaço humano do sertão que realmente tenho conseguido entender o valor desse dom natural.

           

    Dias atrás pude presenciar uma cena triste. Ao chegar em uma comunidade rural daqui da região, horas antes de começar a missa, o caminhão pipa abastecia uma caixa d’água de mil litros e aos poucos cada morador vinha com seus galões encher o que seria o abastecimento de sua casa para pelo menos uma semana. Confesso que fiquei surpreso, o sol já estava escaldante, muitos apressavam seus passos para pegar a água e não perde a missa, outros deixavam para depois da “reza”. A esperança daquele povo era alimentada pela fé de que Deus iria mandar chuva logo para o sertão. Aos poucos seguiam os passos com os recipientes cheios de água como se fosse o presente mais importante de suas vidas.

         

         Semana passada o governo do estado da Bahia aceitou o decreto municipal e declarou Ipupiara em situação de emergência por causa da seca. Já chegam a 170 municípios baianos nessa situação. Semana passada caiu algumas gotas no chão de Ipupiara, mas somando-se todos os dias que choveu, não passou de 15 minutos de pingos fracos e insuficientes para amenizar a situação. Nem as chuvas, desde minha última publicação sobre elas, foram suficientes. Apenas as esperanças se renovam, mas logo são desfeitas. Quem sofre, sobretudo, são os animais e, por conseguinte os homens que ficam atados por esperar o bem mais precioso da natureza voltar a abundar nos solos desse chão.

Que a chuva venha logo e com toda força!!!

Um profeta em Ipupiara

De todas as vezes que estive aqui em Ipupiara e nos dias que se passam, uma pessoa tem sido fundamental para minha pesquisa, Pe. Cláudio Nogueira. Muito mais do que um líder espiritual, do que um padre, ele é um verdadeiro amigo. Ele sabe colocar em prática no seu cotidiano e em suas ações o verdadeiro sentido da palavra PROFETA.

Pe. Cláudio completou 10 anos de presença em Ipupiara. Na celebração preparada por toda paróquia, no dia 24/02, para festejar esse acontecimento, percebi que o carinho e amor do povo para com seu sacerdote transcende a simples hierarquia padre-povo. Ele sabe conduzir o povo, caminhar com ele, alumbrando o pastor das ovelhas que as ama e cuida delas com carinho, entregando sua vida por seu rebanho se preciso.

Minhas palavras nesse momento, para falar de um amigo tão especial são simplesmente insignificantes perante o imenso carinho que tenho por sua pessoa. Quero desejar a meu amigo Pe. Cláudio todas as bênçãos do céu pela passagem de seus 10 anos conduzindo o amado povo de Ipupiara.

Que o desejo de Deus, expressado na música de Pe. Gildásio Mendes, seja motivador na sua caminhada: “Eu te chamei, te consagrei. Anuncia  a minha palavra. Eu te escolhi, te acompanhei. Dá tua vida a meu povo!”

Parabéns Pe. Cláudio! Parabéns Ipupiara!

A Igreja faz o bom carnaval

     Depois de dias sem postar qualquer palavra aqui no blog, volto para falar do carnaval ainda, mesmo já tendo passado toda folia no Brasil e aqui na região. Gosto de começar minhas palavras pensando na ideia de que muitos se perguntam se igreja e carnaval combinam, pois para algumas concepções, carnaval faz parte do profano e, igreja trata do plano sagrado. No entanto, engana-se quem pensa que essa dicotomização é totalizante. Em Ipupiara, em pleno sábado de carnaval (dia 18/02) a Igreja Católica organizou a maior festa da cidade naquele dia.  Como assim, Igreja fazendo carnaval? Isso mesmo. Ipupiara vivenciou o seu 10º PJfest, a festa organizada pela Pastoral da Juventude da Paróquia São João Batista há anos vem quebrando com o preconceito de que religião e diversão estão em lados opostos da balança. Inclusive minha linha de investigação científica busca, num primeiro momento, mostrar que religião e diversão caminham, em muitos momentos, numa mesma via.

Ressaltando o PJFest, posso dizer que foi um evento simplesmente fabuloso, jovens, adultos, crianças, idosos das diversas comunidades puderam se divertir ao som de músicas populares e religiosas. Muito mais do que isso o evento foi uma oportunidade de socialização entre as pessoas regadas por boas conversas, alegria, dança, tudo no espírito cristão do que diz Filipenses (4.4): “alegrai-vos sempre no senhor...” Afinal, a intenção do evento era propor a todos, de maneira especial a juventude, que a vida de cristão, daquele que segue o evangelho não é uma vida fora do mundo, do cotidiano, mas é uma vida que pode propor ao mundo uma nova direção,  a da alegria fraternal.

Aqui, muito mais na condição de cristão católico do que pesquisador (o qual para muitos acadêmicos deve separar suas crenças do rigor científico, tese essa que teimo em rebater), acredito que eventos como o PJfest ajudam a mostrar que o rosto da Igreja também se faz com os jovens.  Por fim, os jovens presentes deram verdadeiro  eco ao que diz a música de Jorge Trevisol: “se a juventude viesse a faltar, o rosto de Deus iria mudar.”

Viva o PJfest!  Viva a juventude!

Um pedaço de Salvador invadiu o sertão...

Tenho imensa alegria de estar escrevendo enquanto a chuva caí lá fora para molhar de novo as terras de Ipupiara. Chuva aqui nunca é sinônimo de tristeza. Nessa alegria venho falar do Carnaval antecipado de Brotas de Macaúbas que tive a alegria de participar. Como bem lembra o título desta postagem, parece que um pedaço de Salvador invadiu o sertão da Bahia. Participei do Bloco “Fica Comigo”, tradicional bloco que sai na noite de sábado no carnaval brotense.

Foto retirada do Blog Brotas Aqui: www.brotasaqui.blogspot.com

        Engana-se, porém, quem acha que a festa só acontece sábado, desde quinta-feira a cidade literalmente interrompeu o seu cotidiano habitual para abrir alas para folia. De quinta-feira (09/02) até domingo (12/02) Brotas de Macaúbas respirou alegria. Os três blocos mais tradicionais da cidade fizeram a festa.  O “Psiu-Psiu”, bloco que saiu na sexta teve animação da banda Caldeirão, conduzida pelo trio elétrico até a praça. Vou pular o sábado para falar depois. No domingo o “Alcoólicos”, bloco mais antigo da cidade, fez sua festa com open bar no tradicional balneário, fechando a festa de momo.

        

        

       Com todo respeito aos demais dias de festa, o sábado foi especial, sobretudo para mim, ainda que não tenha tido participação efetiva nos demais dias. Vesti meu abadá e participei de um carnaval que pouco conhecia, ou seja, uma festa de trio elétrico, axé e bloco. Acostumado com a marcação rígida, pouco deleitosa da harmonia e evolução que estou acostumado nas escolas de samba de Florianópolis, encontrei no carnaval de Brotas de Macaúbas um espaço para mexer meu corpo, desajeitado é verdade, ao ritmo das melhores  músicas do carnaval da Bahia.

         

        O trio elétrico que comandou a festa do “Fica Comigo” teve como atração a banda Rapazolla, bastante conhecida no circuito do carnaval da Bahia, que já teve como intérprete o cantor Tomate, famoso no setor da Axé Music. Mas o auge da festa foi o show de Tatau, antigo cantor da banda Araketu, que hoje faz carreira solo. Foi um show maravilhoso, contagiou todo público que estava na praça, ninguém ficou parado. A animação foi total e eu, como um bom “novo baiano”, curti demais a festa.

      

     Para terminar quero deixar um trecho da bela música de Moraes Moreira, que define o que vivi nesse querido pedaço da Bahia durante esses dias:

       Ah! imagina só que loucura essa mistura. Alegria, alegria é o estado que chamamos Bahia. De Todos os Santos, encantos e Axé, sagrado e profano, o Baiano é carnaval....

Depois que a chuva cai no meu sertão...

       Parece que postagem de ontem já está, em parte, desatualizada. Ontem e hoje a chuva caiu na terras de Ipupiara. Depois de dias secos e quentes, o povo parece estar mais contente. Ainda que eu esteja aqui em Brotas de Macaúbas, as notícias que chegam aqui são as melhores. A cada gota que desabava o povo parecia querer noticiar. A esperança é de que as chuvas engrossem nos próximos dias para poder arrumar as roças, recuperar parte da plantação e encher os reservatórios.

Ao falar da chuva quero lembrar da música de Regina Basílio e outros autores, que diz mais ou menos assim: 

"Depois que a chuva cai no meu sertão, os pássaros cantam alegres. que emoção... Agradecendo ao Criador, por trazer esta água abençoada, brotando com toda força a invernada... As árvores agradecem... Matando a fome no sertão, fazendo brotar vida de montão... Chuva cai abençoada, molha nossa terra arada, faz essa semente, brotar frutos para a vida, faz a nossa gente mais feliz.."

Até a próxima, com notícias do carnaval!

Um mês, alguma festa e muito sol

Hoje completa um mês que estou na Bahia para minha pesquisa de mestrado!

 

      Saibam que estou muito bem, apesar do forte calor que anda fazendo aqui no sertão, parece que a chuva está se esquecendo de Ipupiara, choveu de maneira muito rápida faz três dias. Ainda que tenha caído algumas gotas de chuva isso não foi suficiente para salvar as roças da seca que já começa a rondar. Nunca pensei que eu fosse torcer tanto para que chovesse. Quando o povo escuta as trovoadas no céu parece dia de festa, mas logo o forte vento das terras secas do sertão parece dissipar as nuvens e cancelar a chuva. Como diz o grande rei do baião, Luiz Gonzaga, quem sabe até março não "há de tardar" as chuvas, antes mesmo do dia de São José. 

        
A pesquisa tem seguido seu ciclo, um   pouco de devagar nesse inicio, mas tem acontecido. Tenho tido algumas conversas com lideranças religiosas e políticas, freqüentado casas, praças, fazendo novas amizades. Depois do carnaval  até final de fevereiro a pesquisa deve engrenar a todo vapor. Ainda na semana que vem devo ter uma reunião no gabinete do prefeito de Ipupiara para falar da pesquisa, ter acesso aos arquivos da prefeitura e conhecer como funcionará a articulação para organizar a festa de São João desse ano.
      
Hoje estou em Brotas de Macaúbas, cidade vizinha de Ipupiara para curtir um pouco do carnaval. Isso mesmo, do carnaval. Aqui em Brotas as festas do carnaval acontecem uma semana antes do carnaval oficial, justamente pra não coincidir com o carnaval da capital, Salvador. O carnaval aqui já começou ontem (quinta-feira) e vai até segunda. São dias intensos de festa, trio, axé, blocos e muitos shows, na folia que foi de forma hiperbólica batizada de: O maior carnaval da Chapada Diamantina. A praça da Igreja está enfeitada e pronta pra receber turistas das cidades próximas e do oeste baiano.
 

Vamos para festa, vamos nos divertir!!!